segunda-feira, 7 de maio de 2007

INIMIGOS PODEROSOS



Nesse mesmo ano (1921) um abastado habitante de Mirador, chamado Olympio Souza, ameaça de espancamento uma senhora de nome Anna, parenta de Manoel Bernardino, que veio até sua casa pedir-lhe socorro, ao que Bernardino resolveu interceder e conversar com Olympio mas, este afirma que “nem ele [Bernardino] nem outro qualquer ali era capaz de intervir nos seus atos” ao que Manoel Bernardino respondeu “que se precisasse de companheiros para as armas, tê-los-ia”, retirando-se em seguida convida, para essa “empreitada”, seus amigos, parentes e os pais de moças prostituídas por Olympio, que era dado a defloramentos de moças da região.
Embora Bernardino “não confiasse na Polícia de Mirador”, na tentativa de evitar o confronto, foi à Justiça com cinco companheiros pedir o prosseguimento do processo contra Olympio por balear um rapaz e pelos defloramentos ao que responderam-lhe não adiantar pois o ferimento fora leve e quanto aos defloramentos nenhum processo existia contra ele.
Assim, Bernardino comprou dois rifles e dez caixas de balas mandando buscar mais quarenta caixas em Picos, onde Olympio se encontrava com o mesmo fim. O conflito era iminente.
Os boatos chegaram ao juiz municipal que marcou uma audiência e, pela pressão dos habitantes do “Engeitado” e de Mirador, deliberou que Olympio se retirasse do município e este mudou-se para Grajaú.
Em 1915 Bernardino mudou-se para Palma, distrito de Curador (atual Presidente Dutra), município de Barra do Corda. A escassez de água fê-lo abrir uma estrada, de mais ou menos cinco quilômetros, do lugar Escondido para a Matta, onde fixou residência, em 1916. Segundo Pedro Braga, esta estrada rendeu-lhe ameaças por parte de um fazendeiro que se sentiu prejudicado pois a estrada antiga passava em frente à sua fazenda.
Como Bernardino dedicara-se à abertura da estrada, em 1917 perde o período de plantio e dedica-se ao ensino gratuito, em sua residência visto não haver escolas, às crianças do povoado.
A partir desse ano dedica-se à lavoura (principalmente do algodão).
A esse tempo aparece ali o Sr. Raimundo Arruda, fazendeiro, pecuarista, influente em Codó e em outros municípios onde possuía fazendas, e que havia prostituído duas meninas: Antonia e Margarida ambas com quatorze anos de idade. Sabendo da intenção de um parente de Antonia de casar-se com ela, Arruda armou homens e disparou uma fuzilaria de rifles no povoado com a finalidade de aterrorizar o pretendente e este corre à casa de Bernardino pedindo-lhe armas, que lhe são negadas, e Bernardino fica sabendo que Arruda incendiaria a casa de Domingas, mãe de Antonia.
Bernardino reprova publicamente Arruda e diz não temê-lo, mesmo sabendo da chacina que este fizera em 1913 na aldeia Chinela em Barra do Corda.

Sabendo das notícias, um padrinho e cunhado da adolescente, chamado José Bezerra, foi à Matta buscá-la e tendo sido avisado que Arruda o impediria foi aconselhar-se com Bernardino mas, em meio à confusão, Antonia resolve ficar.
Para solucionar os conflitos na região, onde o Estado só está presente na cobrança de impostos na pessoa do coletor José Lopes Pedra Sobrinho (José Pedra), Bernardino criou a “Liga de Defesa”, contingente de cem “homens de honra” armados. A Liga agia “contra desmandos, truculência, desatinos, os roubos, as fraudes, até questões sexológicas, como desvirginamentos”, ou seja, exercia a justiça em uma terra sem lei. Um conflito entre José Pedra e Felippe Moreira, pela vinda do padre Miguel de Codó, foi resolvido pela Liga.
Em outubro de 1920, Raimundo Arruda volta a armar homens para “tirar a existência” de Manoel Bernardino, este sai em busca dos homens da Liga reunindo, em dois dias, setenta homens armados a rifles e espingardas.
Não conseguindo o contingente esperado, Arruda vai ao Codó pedir ajuda às autoridades, ou seja, mobilizar força policial contra Bernardino já que era influente no lugar. Em três dias chega uma intimação para Bernardino e este comparece acompanhado das meninas prostituídas, dos pais das adolescentes, de testemunhas e de seis homens armados.
A esta altura, Codó estava alarmada pois José Pedra espalhara que Bernardino e setenta arruaceiros invadiriam a cidade. O Delegado Carlos Bayma já havia preparado um telegrama pedindo forças ao Governo, não tendo sido enviado por protestos da Câmara Municipal.
Na audiência foi firmado um acordo dizendo que:

Se apesar de Harmonizados, como iam houvesse depois alguma divergência, deveriam [...] se entender com o inspetor de quarteirão [...] [ou] se deviam dirigir ao Delegado de polícia do Codó. [...] Quanto aos defloramentos [...] nada mais podia fazer, por haver decorrido o prazo legal. E aí por diante nenhuma desinteligência houve entre o declarante [Manoel Bernardino] e o Sr. Arruda.

Sobre este caso, Felinto Ribeiro, em seu conto intitulado “Arruda é remédio de mulher”,demonstra outra versão do acordo. Segundo o Contista, Arruda resolveu o problema dando 500 mil Réis ao Delegado que usou parte para subornar os pais das vítimas para tirarem a acusação contra Arruda e virando-se para Bernardino falou:
-Se os pais das possíveis vítimas não denunciaram o Raimundo, o que tens tu com isso, já que não és parte nenhuma delas? Se tu não tens virilidade Bernardino, larga a vida de Arruda e fica sabendo que arruda é remédio de mulher!

Um outro grande desafeto de Manoel Bernardino era o Subdelegado de polícia do Curador, distrito de Barra do Corda, Sebastião Gomes de Golveia que “era um absoluto, era o juiz, o Delegado, o promotor, o prefeito, o advogado, ele era tudo, era um soberano de muita decisão”, para Manoel Bernardino ele
assumiu para a gente da Matta [...] as proporções de um déspota [...]. Há tempos, entende de mandar na zona da Matta, do município de Codó, e assim é que envia esbirros afim de intimarem os habitantes da Matta a virem em sua presença por isto ou aquilo. Manoel Bernardino aconselhou, várias vezes, não comparecessem, que a jurisdição do homem não se estendia por lá.

Uma personalidade autoritária como parece ter sido Sebastião Gomes não admitiria tamanha insolência e ameaçava constantemente invadir a Matta para prender Bernardino e este só deu crédito às ameaças quando seu amigo Felippe Moreira, após voltar do Curador, o avisou da ameaça. Então ele armou quatorze homens para a sua defesa, isto em meados de julho de 1921.
Foi também nesse período que a crise entre Bernardino e o coletor de impostos do Estado, Sr. José Lopes Pedra Sobrinho (José Pedra ou Zeca Pedra), se intensificou. José Pedra “tem vexado o povo, exigindo impostos, sem se compadecer até dos aleijados”, além disto, ele, que se tornou um grande fazendeiro, solta seus animais nas roças dos lavradores pobres, autoriza seus amigos a criarem porcos soltos, danificando o açude de uso comum, prejudica tanto a população que “o povo da Matta o odeia a tal ponto que, se não fora [Bernardino],[...] já lhe teriam tirado a vida”.
Conforme Bernardino, foi no intuito de salvá-lo que ele foi “convidado” a se retirar da Matta em fins de julho de 1921 e também se o matassem a culpa cairia sobre Bernardino. Lopes Pedra cobrava os tributos de acordo com sua vontade encontrando em Bernardino grande oposição que culminou na sua expulsão do povoado.
Esse é o quadro das relações de Manoel Bernardino de Oliveira, admirado e respeitado pelo povo, que a ele recorre para aconselhar-se ou solucionar problemas; odiado por fazendeiros, cobradores de impostos, Delegados e todo tipo de arbitrariedade tão comum no Maranhão e no Brasil do começo do século XX (e por que não dizer atualmente?). Inimigos importantes que aguardam e articulam o melhor momento para atacar.
Quando o coletor é expulso da Matta (final de julho) dirige-se para Curador e se organiza com Sebastião Gomes que já armara homens para atacar a Matta.

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